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Análise: Odin Sphere: Leifthrasir (Multi) é fantasia e beleza 2D

O jogo da Vanillaware passou por mudanças profundas e o resultado é um título novo, mais acessível e interessante.

Odin Sphere foi um dos últimos jogos de destaque do PS2 e recebeu muitos elogios na época por conta de seu visual e universo. Infelizmente, o título tinha alguns problemas técnicos, além de mecânicas de jogo complicadas demais. Foi pensando nos fãs e nas novas plataformas que a Vanillaware decidiu produzir Odin Sphere: Leifthrasir para PlayStation 4, PlayStation 3 e Vita. Trata-se de uma reimaginação do jogo de PS2 e conta com novas mecânicas, gráficos retrabalhados e conteúdo adicional. As mudanças foram tão significativas que a sensação é a de jogar algo completamente novo.

Fantasia em forma de livros

Odin Sphere é uma espécie de história de fantasia que mistura referências da mitologia nórdica e contos de fada. A premissa é, de fato, fantasiosa: uma garota, em um sótão, lê livros, cujos volumes retratam as tramas de cinco personagens distintos em um mundo fantástico, com direito a capítulos e atos. Toda a aventura é bem linear, ou seja, nada de missões paralelas e coisas parecidas, o que faz sentido ao se levar em conta que tudo não passa de uma garota lendo livros. Por fim, nada da trama foi alterada no remake.

A trama do jogo é focada em Erion, uma terra que é palco de conflitos entre nações. O ponto central é a luta por um artefato mágico poderoso, mas, pouco a pouco descobrimos que existem outras questões a serem respondidas. Algo que gostei muito é a forma como a história é apresentada: cada livro foca nos conflitos pessoais de cada personagem, mas, em conjunto, todos eles desenvolvem também o universo do jogo de forma fragmentada. As tramas se passam em tempos distintos e observamos os fatos de ângulos diferentes, o que pode deixar as coisas um pouco confusas no começo, mas no final o resultado é bem coeso e interessante.

Confesso que no começo eu achava tudo bem confuso, mas, rapidamente, vi-me fisgado: montei teorias, afeiçoei-me aos personagens e tentei entender exatamente o que estava acontecendo. Claro, precisei de um pouco de atenção para entender tudo, contudo isso faz parte da diversão. O jogo conta com uma linha do tempo da trama, o que é perfeito para entender onde cada evento se encaixa na cronologia da saga.

Reimaginando o original

Em Leifthrasir, a história continuou intacta, mas todas as mecânicas de jogo foram completamente retrabalhadas. A ideia básica e a progressão da aventura não foram alteradas: cada livro é dividido em momentos de cenas não interativas e estágios de ação. Os personagens exploram estágios que apresentam progressão em duas dimensões, derrotando inimigos e chefes pelo caminho em batalhas em tempo real.

Vamos ser sinceros: Odin Sphere era um jogo belíssimo no PS2, mas suas mecânicas não eram das melhores. Os controles eram travados, os sistemas de experiência e inventário não eram intuitivos, e os personagens eram extremamente parecidos entre si no combate. Muitos jogadores gostam muito do original, mesmo com os vários problemas, mas, para alguns, ele era uma aventura cansativa e repetitiva — eu mesmo não sou muito fã do original.


Leifthrasir mexeu tanto nas principais características que o resultado é um jogo novo, bem mais acessível e divertido. Toda as alterações profundas estão presentes no modo Refined. O combate, agora, é mais fluído e repleto de opções de ataques e combos — é como se fosse um Muramasa (Wii/Vita) melhorado. O inventário foi expandido e dividido em sessões, o que facilita gerenciar os itens. O sistema de níveis ainda depende de ingerir comida e absorver Phozons (as almas dos inimigos derrotados), mas ele foi melhorado: é possível comer vários itens de uma vez, os Phozons podem ser guardados para serem utilizados posteriormente, inimigos também dão experiência, entre outras modificações. Por fim, os mapas foram alterados e contam com sessões que não são esféricas, o que os tornam mais coesos e mais fáceis de navegar. Existem várias outras alterações menores e também conteúdo novo.

Tecnicamente, o jogo está muito melhor também. Os gráficos foram retrabalhados e agora tudo está em alta definição, o que deixa o visual ainda mais belo. Tempos de carregamento estão bem menores, praticamente imperceptíveis. E slowdowns, que apareciam com frequência na versão de PS2, foram praticamente eliminados (só vi alguns poucos engasgos quando uma quantidade absurda de coisas aparece na tela).

Uma das mudanças que mais gostei foi a alteração no sistema de níveis e a criação de itens. No original, era necessário plantar sementes durante a batalha para gerar alimentos e cada item era consumido um por vez — subir de nível era demorado e cansativo. Poções exigiam receitas. Em Leifthrasir, é possível plantar várias sementes simultaneamente e consumir muitos itens de uma vez, o que acelera o processo significativamente. Além disso, é possível guardar os Phozons para serem utilizados depois. E qualquer tipo de poção pode ser feita desde o início da aventura, basta ter os itens necessários. Com isso, o jogador dita o ritmo do desenvolvimento dos personagens, o que deixa tudo mais ágil e simples.


Controlando guerreiros em lutas intensas

A fluidez do combate é a característica que mais gostei em Odin Sphere: Leifhtrasir. Controlar os heróis é bem divertido, pois eles são bem ágeis e têm vários golpes à disposição. É muito fácil fazer inúmeras sequências de ataques diferentes, combinando as várias técnicas especiais. Poções mágicas, que podem ser fabricadas a qualquer momento, ajudam a trazer variedade aos combates e adicionam um pouco de estratégia. A combinação dessas características tem como resultado um combate intenso e recompensador.

As mecânicas de luta são as mesmas para todos os personagens, mas cada um tem um estilo único. A valquíria Gwendolyn é balanceada e tem muitos ataques e feitiços, perfeita para entender o básico. O príncipe Cornelius é bem ágil e o resultado são combos mais longos e rápidos. Já o cavaleiro negro Oswald não é muito forte, mas pode entrar em um estado possuído no qual ele se torna bem poderoso — saber dosar quando ativar esse poder é uma de suas principais características. A feiticeira Velvet usa uma corrente que permite agarrar e lançar inimigos, com golpes à distância. Por fim, temos Mercedes, que apresenta mecânicas diferenciadas: a fada voa pelo ar, lançando tiros com seu arco mágico, quase um shoot ’em up. Cada herói oferece uma experiência bem única.


Existem muitas técnicas, feitiços, habilidades e poções, mas isso pouco contribui para esconder um problema de Odin Sphere: Leifthrasir: ele é um jogo fácil. Comecei a aventura no nível ‘normal’ e rapidamente mudei para ‘difícil’ e, mesmo assim, só tive problemas em poucos chefes e salas específicas de desafio — principalmente aquelas nas quais temos que enfrentar mais de um chefe simultaneamente. A causa disso é que, no geral, derrotar os inimigos não exige muita estratégia. Sendo assim, boa parte das batalhas consiste em só apertar o botão de ataque repetidamente e usar técnicas especiais em sequência. É divertido fazer combos e destruir tudo pela frente, mas pode ficar repetitivo depois de um tempo. Uma maneira de tentar compensar isso é a dificuldade “Heroic”, que limita drasticamente os atributos dos heróis — uma pena que ela só é liberada depois de terminar o jogo.

De novo e mais uma vez

Fora dos combates, os heróis exploram estágios bem básicos e sem muito o que fazer. Não há puzzles ou coisa parecida, no máximo uma porta trancada ou eventual obstáculo que podem ser facilmente superados — existem salas secretas que, em sua maioria, estão até bem escondidas. Isso não chega a ser um grande defeito, já que o foco, aqui, é justamente a história e o combate. Enquanto não estava lutando, passei boa parte do tempo combinando poções e criando itens para fazer receitas e isso já foi o suficiente para me entreter.

Os cenários do jogo utilizam a temática de fantasia como inspiração: os personagens exploram ruínas no deserto, densas florestas e cidades de temática medieval. Todas as localidades são bem bonitas e detalhadas, com elementos pintados à mão. Gostei especialmente de Nebulopolis, o lar de Gwendolyn: o lugar parece estar em noite perpétua, com estrelas riscando o céu infinitamente, sendo o resultado muito agradável visualmente. Uma pena que a produtora Vanillaware preferiu cenários já muito utilizados anteriormente no gênero, gostaria muito que existissem alguns lugares mais únicos. Já a música é muito boa e complementa bem a ambientação de fantasia.


O custo de desenhar tudo isso à mão é o reaproveitamento. Estágios e inimigos são reaproveitados em todas as histórias dos personagens. Para piorar, basta usar as mesmas estratégias para se sair vitorioso. Esse reúso de conteúdo, em combinação com a pouca estratégia exigida por certos combates, reforça a sensação de repetição.
O jogo original de PS2 está incluso no pacote e conta com todas as melhorias técnicas do modo Refined. Além disso, ele oferece opções para tornar a aventura mais agradável, como rebalanceamento de atributos e alguns facilitadores. As mecânicas continuam idênticas às do original, mesmo com esses modificadores ligados. Com isso, o título se torna mais agradável de ser apreciado, por mais que ainda um tanto quanto rígido em relação ao modo reimaginado.

Um belo renascimento

As inúmeras mudanças em Odin Sphere: Leifthrasir justificam o remake. O título é praticamente um jogo completamente novo e possui mecânicas divertidas, história interessante e belo visual. A repetição presente no original foi diminuída com a adição de extras e novos inimigos, mas ainda existe e incomoda. Outro problema é a dificuldade: jogadores mais experientes podem achar os desafios um pouco fáceis, mesmo no modo “difícil”. As muitas qualidades de Odin Sphere: Leifthrasir faz dele um ótimo remake e aqueles que gostam de belas aventuras 2D não podem deixar de conferi-lo.

Prós

  • Ótimo visual e música;
  • Mecânicas de combate divertidas e repletas de possibilidades;
  • Trama fragmentada, porém interessante;
  • Jogo original incluso no pacote, com várias opções para melhorar a experiência.

Contras

  • Desafio baixo, na maior parte das vezes, mesmo no modo difícil;
  • Reúso de cenários e inimigos trazem sensação de repetição.
Odin Sphere: Leifthrasir — PS4/PS3/PS Vita — Nota: 9.0
Versão utilizada na análise: PS4
Revisão: Jaime Ninice

é brasiliense e gosta de explorar games obscuros e pouco conhecidos. Fã de Yoko Shimomura, Yuzo Koshiro e Masashi Hamauzu, é apreciador de boardgames, game music, fotografia e livros. Além de mostrar seus cliques no Flickr, tem também um blog onde escreve sobre inúmeros assuntos e também pode ser encontrado no Twitter.

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