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Análise: Deus Ex: Human Revolution (PS3)

Quando uma desenvolvedora se propõe a fazer a continuação de uma série de sucesso, ou fazer um remake , todos ficam com um pé atrás. Deu... (por Unknown em 04/03/2012, via PlayStation Blast)

Deus Ex: Human Revolution (PS3) Quando uma desenvolvedora se propõe a fazer a continuação de uma série de sucesso, ou fazer um remake, todos ficam com um pé atrás. Deus Ex foi um fenômeno no início da década passada, revolucionando muito do que as pessoas viam como possível num videogame e influenciando diversos jogos dali em diante. A Eidos Montreal assumiu o risco de criar uma terceira parte da história, e o resultado foi Deus Ex: Human Revolution. Ah, você quer saber se o jogo é bom? Melhor ler esta análise, então. E atenção aos detalhes.

deus_ex1Não conhece a série Deus Ex? Não tem problema, vou te ajudar. O primeiro jogo foi lançado em 2000 para PC. Cheio de conceitos novos, o jogo combinava elementos de RPG, FPS, adventures e, o mais interessante: "simulação imersiva". Esse último trata-se do seguinte: a equipe preocupou-se em fazer com que o jogador não fosse lembrado que estava jogando um videogame, através da perspectiva em primeira pessoa e as muitas interações com o ambiente e outros personagens. A história girava em torno de JC Denton, um agente de uma célula anti-terrorista do governo americano. No ano de 2050, a humanidade desenvolveu a nanotecnologia a um ponto que pode alterar o próprio corpo o quanto quiser, criando super-humanos e evoluindo a espécie além dos meios naturais. O jogador pode melhorar as habilidades de JC através de implantes nanotecnológicos e personalizar, dessa forma, seu personagem.

Outro ponto forte da série sempre foi a possibilidade de escolha. Era possível abordar a mesma situação de diversas formas. Falarei mais sobre isso depois, mas fato é que Deus Ex foi um sucesso absoluto. A crítica amou o jogo, assim como o o público, e ele recebeu diversos prêmios por sua ousadia e criatividade. Sua continuação, Deus Ex: Invisible War, não foi tão bem recebida, mas manteve os pontos fortes de seu antecessor. Esse último foi lançado em 2003, mas a Eidos Montreal levou 4 anos para anunciar um novo título, até ali chamado de Deus Ex 3. Só em 2011 ele chegou às lojas, sob o título Deus Ex: Human Revolution, e era na verdade uma prequel dos anteriores.

Adam Jensen “Este não é o fim do mundo, mas você pode vê-lo daqui”

A história começa no ano de 2027. O personagem principal é Adam Jensen, chefe de segurança das Indústrias Sarif, uma das líderes da produção de modificações cibernéticas no mundo. Essas modificações ainda não são tão avançadas quanto no original, bem distantes da nanotecnologia, e sendo baseadas em implantes ou substituições.

Adam tem um relacionamento com a cientista chefe dos laboratórios da empresa, chamada Megan Reed. Logo no início do jogo, esses laboratórios são invadidos por um grupo hostil não identificado. Após uma pequena introdução, que apresenta os básicos da jogabilidade e da história, já ocorre a primeira reviravolta: Adam e Megan são atacados por um homem cheio de melhorias cibernéticas. O resultado é que o protagonista é deixado à beira da morte e sua namorada é assassinada e tem o corpo carbonizado pelos terroristas, que vão embora levando boa parte das pesquisas.

Num clima bem Robocop, Adam é resgatado e tem seu corpo profundamente alterado para que seja salvo. Seus braços, olhos, cérebro - tudo recebe algum tipo de melhoria cibernética, e ele se torna um tipo de ciborgue. O jogo começa de fato após esses acontecimentos, e Adam começa a investigar o que ocorreu, ao mesmo tempo em que tenta acostumar-se com essa sua nova situação. É claro que existe uma conspiração por trás de tudo, e é essa trama que o protagonista vai destrinchando aos poucos.

O mundo de Deus Ex: Human Revolution é muito rico. Além da "camada inicial" da história, existe todo um pano de fundo. A sociedade está dividida, as opiniões acerca da tecnologia como forma de evolução são muito divergentes. Revoltas estouram aos poucos, e Jensen se vê no meio disso. Você pode se aprofundar nessa história, ler cada e-mail, entrar em cada apartamento, falar com cada pessoa... ou pode simplesmente fazer as missões principais, e o jogo não vai te punir por isso.

Óbvio que não vou colocar aqui nenhum spoiler, mas a história do jogo se desenvolve de forma natural e interessante, e culmina num dos finais mais incríveis e abertos para escolha pessoal que já vi. Eu fiquei dez minutos parado na frente da TV sem saber qual opção eu queria escolher. Sinal que o jogo conseguiu me deixar completamente imerso e eu senti que aquela decisão era minha, e não de um personagem alheio. Ou seja, o jogo fez exatamente o que queria.

Como se joga?

Como você já deve ter deduzido, Deus Ex é um jogo em 1ª pessoa. No entanto, isso não acontece o tempo todo. Quando você usa o comando para Jensen se esconder atrás de algum cover, subir escadas ou usa determinadas habilidades, a visão passa para terceira pessoa. Essa mistura é interessante e funciona bem na maior parte do tempo.

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Para orientar o jogador, há um sistema de “apontar” os objetivos. Se eles estiverem no mesmo nível de terreno que Jensen, o símbolo será um “X” (amarelo se for uma missão principal ou azul se for uma sidequest). Por outro lado, se o objetivo estiver em outro nível, o símbolo pode ser uma seta apontando para baixo ou para cima. De qualquer maneira, ao lado é apresentada a distância, em metros. Pode parecer confuso, mas não é.

Qual Deus Ex você quer?

Um dos maiores trunfos de Deus Ex é adaptar-se ao estilo de cada jogador sem privá-lo de nada. Claro que as recompensas (os pontos de habilidade e itens) são maiores se você explorar bastante e for mais infiltrador que soldado mas, em compensação, o jogo se torna bem menos desafiador se você preferir sair por aí atirando.

Aliás, esses pontos de habilidade funcionam assim: Adam tem vários implantes em diversas partes do corpo. Seus olhos é que são responsáveis pelos dados mostrados na tela do jogo e granadas de pulso eletromagnético podem desativá-los. Para melhorar o personagem, você ganha os pontos de experiência, que no jogo acumulam-se para dar acesso aos chamados Praxis Points. Esses últimos é que servem para melhorar cada habilidade de Jensen. Como é mais difícil de consegui-los, você acaba tendo de priorizar algumas coisas e deixar outras de lado. Também é possível comprá-los, sempre em quantidade limitada, ou encontrar Praxis Kits contendo os pontos, em locais escondidos.

Um exemplo: se você quer seguir a linha mais stealth do jogo, o ideal é investir nas habilidades de supressão de som dos passos, no sistema de radar e até na invisibilidade. Se prefere um jeito mais combativo, basta investir na força física, resistência e mira. Também é possível resolver muitos problemas usando a melhoria social de Adam, que lhe mostra o que os outros personagens estão sentindo e a melhor forma de persuadi-los, facilitando assim o acesso a diversos locais. Por último, você pode investir na habilidade de hacker de Adam, podendo invadir locais, desativar alarmes e controlar câmeras e robôs de segurança.

Em resumo, é possível abordar as situações de Deus Ex de diversas formas. Sempre há uma rota alternativa, um computador a ser hackeado ou uma forma de sair quebrando as paredes e detonando os inimigos feito o Rambo. O jogo pode ser o que você quiser que ele seja: um FPS com elementos RPG, um RPG em primeira pessoa com elementos de ação, um jogo de ação em primeira pessoa com elementos de RPG...

Um robô social

Parte importante de Deus Ex são os diálogos. Em diversos momentos, você pode evitar completamente uma sequência de combate e/ou de invasão de alguma localidade através do diálogo. São esses diálogos também que te trazem as sidequests, que não são muito numerosas, mas que adicionam uma boa quantidade de informações à história. Até o passado de Jensen possui segredos que são revelados através de uma sidequest particularmente longa e interessante.

Em outros momentos, o jogo entrará automaticamente num "sistema" de diálogo, possibilitando a você tomar diversas linhas, desde a resposta mais rude até uma mais suave, e tudo isso com o intuito de conseguir algo. Seja acesso a delegacia ou impedir o suicídio do personagem em questão, tudo fica em suas mãos.

Além disso tudo, você pode sair por aí falando com as pessoas na rua, embora muitas vezes elas falem sempre a mesma coisa de formas diferentes. Algumas podem ser surpreendentes, como alguns que dizem que "você não pode simplesmente chegar em alguém e sair puxando assunto, rapaz", dando um toque de humor.

Detalhes, detalhes

A maior recompensa que Deus Ex dá aos jogadores mais exploradores são os detalhes. Hackear computadores para ler e-mails pode render bons easter eggs ou até facilitar a invasão de determinadas áreas. Invadir apartamentos pode ser mais revelador do que você imagina.

Um bom exemplo: numa determinada área do jogo, há um apartamento com um nível de segurança particularmente alto. Quando você chega a esse nível na habilidade hacker, você pode entrar lá e, surpresa! O apartamento é um mini-laboratório clandestino para instalação de melhorias cibernéticas. A história principal do jogo nem sequer toca nesse detalhe, mas o apartamento está lá. É impossível não admirar essa atenção aos detalhes.

O escritório do chefão dos negócios David Sarif mostra a identidade visual do jogo
Além disso, se isso fosse um filme, mereceria o Oscar de Direção de Arte. Tudo no jogo, desde o figurino dos personagens até os cenários, segue uma linha bem clara e definida, e dão um toque de originalidade e estilo a tudo. Até mesmo a trilha sonora segue essa mesma linha e isso, por si só, já merece elogios. Dentro desse mesmo assunto, é interessante notar que todos os personagens que apoiam a causa das melhorias cibernéticas usam roupas com fortes influências renascentistas.

Nada é perfeito

Nada mesmo. Especialmente no campo dos gráficos, Deus Ex pode deixar bastante a desejar. Os cenários são bonitos e os efeitos de iluminação não costumam falhar mas, em compensação, os modelos de personagens…

Personagens duros e sem expressão
Além dos personagens “copia e cola”, quase todos têm uma completa falta de expressão facial. Alguns têm até um rosto um pouco caricato, que acaba contradizendo o clima tenso e sombrio de boa parte do jogo. Para completar, eles se movem de forma estranha e mesmo a movimentação de Jensen não é muito realista. Mas, com um pacote tão rico, é possível esquecer esses detalhes e aproveitar o restante.

O problema de verdade reside na forma estranha como as batalhas contra os chefes foram feitas. A Eidos Montreal “terceirizou” essas batalhas e (surpresa!) assim que elas começam, boa parte da liberdade de escolha do jogador se perde. Não é possível derrotá-los sem uso da força letal. Aí você pensa: “eu passei o jogo todo me segurando e me esforçando para não matar aqueles guardas, e agora vou enfiar essa lâmina no pescoço dessa pessoa, assim?”. E pior: você nem ao menos tem controle sobre isso.

Não que essas batalhas sejam chatas ou desagradáveis. Duas delas, inclusive, são bem interessantes, especialmente uma mais para o final do jogo. Mas a primeira é dolorosamente “dura”, sem dar espaço para o stealth ou a estratégia. São definitivamente uma quebra no ritmo excelente do jogo e um tapa na cara de quem vinha até ali investindo nas melhorias para furtividade e hacking.

Prós

  • Liberdade de escolha enorme
  • História interessante e bem escrita, cheia de ramificações e dilemas morais, com finais bem feitos
  • Atenção aos detalhes, desde sidequests até cenários
  • Imersão impecável, exceto pelas batalhas com chefes

Contras

  • Personagens esquisitos e duros
  • Batalhas contra os chefes parecem absolutamente “fora” do jogo
  • Dublagem nem sempre está no padrão atual

Deus Ex: Human Revolution – PlayStation 3 – Nota: 9,0
Gráficos: 8,5 | Som: 9,0 | Jogabilidade: 9,5 | Diversão: 10,0

Revisão: Rafael Becker


Escreve para o PlayStation Blast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original do mesmo.

Comentários

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  1. Sempre que eu leio análises de Deus Ex fico me perguntando:será que essa pessoa jogou o mesmo jogo que eu? Pq eu não vi onde vc pode escolher entre o modo stealth ou força bruta. Eu fico pensando que todo mundo escolheu o stealth, por isso falam que há essa escolha. Porque eu escolhi o força bruta e não passei da primeira missão.Não sei se eu estava num dia ruim, ou se o jogo que é difícil mesmo. Na época eu fiquei chateada, pq a história parece muito boa, mas não consegui jogar mesmo.

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  2. Joelma, eu joguei boa parte do jogo fazendo um misto de stealth e força bruta, e, sim, o combate é mais difícil no começo se você tenta ir direto na força bruta. Depois fica cada vez mais fácil, conforme você vai comprando as melhorias. Mas também não é fácil ser stealth o tempo todo, por isso o misto. O jogo é equilibrado. Jogando do jeito certo, se torna quase fácil.

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